O dia amanheceu e Lia deu graças a Deus, sentindo-se aliviada por ter
despertado de um sonho pra lá de horrível. Estava ensopada de suor e a primeira
coisa que fez foi correr para o banheiro, tomar uma chuveirada para refrescar a
mente. Sonhara com um par de chinelos que fora deixado na porta de sua casa e
um aviso de que lhe traria muitas infelicidades, motivo que a deixou
perturbada.
Lia tomou seu banho, fez a sua primeira refeição do dia e até esqueceu o
sonho, coisa que não queria mais saber. Morava sozinha e não teve nem com quem
comentar o maldito sonho, indo para o terraço olhar a rua e dar umas baforadas
de cigarro, um vício que alimentava. Qual não foi o seu espanto quando viu um
par de chinelos na entrada da casa, em frente ao portão. Refeita do susto pegou
os chinelos e jogou no meio da rua, entrando em seguida, intrigada com isso. O
dia passou e ela se distraiu com leitura, passando depois a ouvir música, já
que era um final de semana e não precisava trabalhar. À noite foi dormir
normalmente, lembrando do sonho, mas não quis se importar.
No dia seguinte acordou tranquilamente, fez o café e se alimentou. Era
domingo e tencionava pegar uma praia. Quando ia saindo viu os malditos chinelos
na sua porta, deixando-a assustada. Pronto, perdeu o dia, se perturbou, mas
pegou os chinelos e jogou-os em outra rua, voltando para casa e desistindo de
ir à praia. Preferiu ouvir música e ler alguma coisa, o que mais gostava.
A noite chegou e Lia já se preocupava com esse fato, com o sonho que
perturbou a sua vida, não sabia o que fazer, indo dormir já pensando em
encontrar o par de chinelos novamente. Por ter jogado longe imaginou que eles
não viriam sozinhos lhe importunar.
Acordou na segunda-feira tranquila, era dia de branco e precisava sair
para o trabalho que a esperava. Levantou e ganhou a sala, deparando-se com o
par de chinelos na porta, na parte de dentro. Lia quase perdia os sentidos mas
teve coragem e com bastante raiva pegou os chinelos e cortou-os de faca,
jogando os pedaços num saco e colocando na rua, pronto para o caminhão do lixo
levá-lo. Saiu para trabalhar constrangida, tendo sido esse o pior dia da sua
vida, pois nem se concentrou direito no seu trabalho.
A sua noite foi bastante agitada, não conseguindo dormir, virando-se pra
lá e pra cá na cama. Levantou-se, tomou água e voltou para a cama, até que
conseguiu finalmente pegar no sono. Sonhou novamente com o maldito par de
chinelos e dessa vez teve a nítida impressão de ter ouvido uma voz que dizia se
ela calçasse os chinelos morreria. Isso a deixou apavorada na manhã seguinte
quando acordou. Levantou-se e dirigiu-se para a sala, esperando encontrar os
chinelos, mas não os viu. Esboçou uma certa satisfação, porém teve a sensação
de que se sentia leve, que parecia flutuar e ao baixar a cabeça viu que estava
com os chinelos nos pés, em vez dos seus. Teve um mal súbito e caiu pesadamente
na sala, como se estivesse sido jogada do alto. Lia morreu conforme dissera a
estranha voz do sonho.
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