Trinta e dois anos se passaram depois que
deixamos o sítio onde morávamos, eu, meus pais e uma irmã, além de uma
empregada que nos servia há anos. Era uma vida pacata, sobrevivíamos com o que
era plantado, pois o salário do meu pai como funcionário de uma usina de açúcar
era muito pequeno e mal dava para as despesas. Joana, a empregada, recebia uma
pequena mesada por mês, já que meu pai se compadeceu de sua situação como
rejeitada da família e a convidou para morar conosco, pelo menos ajudaria minha
mãe nas tarefas domésticas.
O tempo ali no sítio parecia parado, como
criança eu pouco tinha o que fazer, além de frequentar uma escolinha nas
redondezas junto com minha irmã no horário da manhã e à tarde passava o tempo
brincando no largo terreiro na frente da enorme casa de estilo antigo, herança
da minha avó materna. Além das tarefas domésticas Joana gostava de bordar,
atividade que ensinou para minha mãe. Meu pai saía cedo para a usina e voltava
no final da tarde, sempre trazendo um pouco de açúcar para o nosso consumo.
Certo dia encontrei Joana meio chorosa, o
que preocupou minha mãe, porém o motivo nunca foi descoberto. Uns dois dias
depois Joana sumiu misteriosamente, o que nos deixou bastante preocupados.
Nunca mais soubemos notícias dela e sua família pouco se interessou pelo assunto.
Com o passar dos anos começaram a surgir boatos de vizinhos de que uma mulher
era vista nas proximidades de um poço que existia no quintal de nossa casa.
Carregava uma criança nos braços e sempre desaparecia na escuridão. “Me tirem
daqui!” era a frase que sempre repetia, o que assustava as pessoas que se
recusaram a pegar água no poço depois que anoitecia. Esse poço servia aos
nossos vizinhos e era uma água de boa qualidade, perdendo esse sabor depois que
esse fato passou a ocorrer em nossa propriedade.
Algum tempo depois os vizinhos dos lados,
amedrontados com as aparições, resolveram se mudar e nós ficamos praticamente
isolados, já que os outros vizinhos ficavam a uma certa distância e isso estava
preocupando minha mãe. Já meu pai aparentava uma calma que me deixava
pensativo, achava eu que ele era um homem destemido, não tinha medo de
assombração. Com o passar dos dias ele veio a adoecer repentinamente, não
podendo mais trabalhar, o que dificultou muito a nossa situação financeira.
Meses depois ele veio a falecer, o que nos deixou numa situação bem pior. Minha
mãe decidiu vender o imóvel e nos mudamos para outra cidade onde tínhamos
parentes e que recebemos total apoio.
Depois de tantos anos resolvi voltar ao
local movido tanto pela beleza ali existente como para saber se o fantasma
ainda assustava as pessoas. De fato, os comentários eram os mesmos e isso me
intrigava bastante, eu faria tudo para desvendar esse mistério, saber o que
realmente havia acontecido e o porquê do sumiço de Joana. Será que ela tem
alguma coisa a ver com isso? Será ela o fantasma que assusta o povo daquele
lugar tão pacato e agora abandonado se encontra? Procurei investigar e depois
de vários contatos com pessoas que residiam na localidade e conheciam a nossa
família, ninguém soube me informar nada, dar alguma pista que me levasse a
solucionar esse problema. Eu já ia me retirando do sítio depois de cansativas
investigações, sem êxito algum, quando um senhor idoso aparentando uns 80 anos,
sentado em uma pedra, me chamou e indagou o que eu queria. Depois de algumas
explicações minhas ele me prometeu contar a verdade sobre esses fatos no sítio.
Trabalharam juntos na usina e estavam sempre papeando a respeito de assuntos
diversos, conhecia todo mundo daquele encantador lugar. Disse ele que meu pai
havia se engraçado de Joana, na época uma mulher formosa, que veio a engravidar
dele e como não queria assumir o filho, orientou-a a cometer aborto, o que foi
negado por ela. Não querendo que esse assunto chegasse aos ouvidos da esposa
resolvera eliminar Joana, jogando-a no poço amarrada a uma pedra. Nunca mais
ela fora vista e foi dada como desaparecida. Esse fantasma que as pessoas veem
próximo ao poço é Joana pedindo para tirarem seus ossos de lá, concluindo que a
frase “Me tirem daqui!” é com relação a isso, disse ele.
No
dia seguinte, por solicitação minha, foi feita uma busca minuciosa no fundo do
poço e um esqueleto lá se encontrava, preso a um cabo pelo pescoço. Estava
então desvendado o mistério do sumiço de Joana e o motivo de sua morte. Meu pai
adoecera talvez por conta desse crime, não suportando a angústia, culminando
com o falecimento.Nunca mais surgiram comentários a respeito do fantasma do poço e a tranquilidade voltou ao lugar.
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