segunda-feira, 26 de março de 2012

PAOLA, A SOLITÁRIA

    Sentada na classe, olhar firme na lousa, Paola ouvia atentamente as explicações do professor. Cursava o segundo ano de Medicina e seu sonho era se tornar uma médica que atendesse a classe menos favorecida, um desejo que pouca gente se interessa. Ainda na flor da idade, com seus 19 anos, era uma moça tranqüila, não tinha namorado, pouco ia a festas e estava sempre no seu quarto estudando, revisando uma matéria ou passando a limpo algum trabalho da faculdade.
    Alguns colegas viam Paola como uma pessoa dedicada aos estudos e preocupada com o futuro, enquanto a maioria apenas zoavam, a chamavam de chata e a tachavam de solitária, pois nunca estava em grupo, procurando ficar afastada e falando somente o necessário com os poucos amigos de verdade.
    Lá fora, um jovem de seus vinte e poucos anos aguardava pacientemente a saída dos alunos, consultando o relógio vez ou outra. Era Fábio, um velho conhecido de Paola, que morava perto de sua casa. Morria de vontade de namorá-la, mas ela não lhe dava bola.
    Tocou a campainha e todos se retiraram da sala, ficando apenas Paola organizando alguma coisa antes de arrumar sua pasta.
    Fábio, inquieto, estranhou por não ver Paola sair. Dirigiu-se para o corredor por onde saem todos os alunos. Viu que Paola saía de uma sala e a cumprimentou, se alegrando com o seu sorriso um tanto reservado. Saíram juntos, ele pediu para acompanhá-la. No caminho ele insistiu que gosta dela e implorou para que namorassem, sendo recusado nessa investida. Outras tentativas aconteceram, no entanto sem sucesso. Paola continuava firme na sua decisão, o que deixava Fábio bastante chateado a cada dia.
    O tempo passou e finalmente um dia muito especial chegou para Paola, aquela moça simples, calada e sempre com poucos amigos. Enquanto todos comemoravam, gritavam, se abraçavam e bebiam no bar, ela permanecia quieta, sempre na dela, portadora de uma solidão que só ela saberia explicar. Mas estava alegre, havia conseguido o que tanto desejava.
    Em casa a alegria de seus pais era grande, finalmente a filha única dava um grande prazer para eles, se tornava uma doutora. Um jantar especial foi servido pela empregada da casa, em homenagem a mais nova integrante da Medicina, aquela que iria cuidar da saúde das pessoas, principalmente aquelas de poucos recursos que procuravam o serviço público.
    Alguns anos se passaram e Paola foi convidada para atuar numa cidadezinha do interior, nos arredores de sua cidade. Foi uma experiência muito boa e que deixou-a bastante feliz, pois estava tendo contato com pessoas pobres, pessoas que ela jurou um dia ajudar.
    Paola estava satisfeita com aquele trabalho, numa cidade interiorana bem agradável, onde podia desfrutar de um clima agradável e nas horas de folga sempre dava um passeio pelo parque e ruas arborizadas, uma característica do local. Já haviam se passado vários anos e ela estava acostumada com aquela cidadezinha tranqüila, o que fez ela se mudar para lá. Morava sozinha e com seus quase quarenta anos nunca tinha se casado nem tampouco arranjado alguém para conviver. Teve alguns namoros passageiros, mas nada de compromissos sérios, estava acostumada já com a vida solitária e achava que era melhor só do que mal acompanhada.
    Um certo dia Paola resolveu dar um passeio na cidade grande, onde morou quando era jovem.  Caminhava tranqüila por uma praça quando seu ombro foi tocado por u’a mão e um tom de voz grave chamou o seu nome. Virou-se um pouco assustada e quase não reconheceu a pessoa. Era Fábio, seu antigo admirador, que a reconhecera. Não foi difícil para Paola reconhecê-lo, apesar do tempo que passou sem encontrá-lo. A barba branca e o corpo franzino, esquelético, deixou-a bastante impressionada. Ficou com pena e deu atenção a ele. Sentados em um banco falaram de suas vidas e relembraram os tempos quando ela freqüentava a faculdade.
    Depois de um certo tempo Paola resolveu se despedir, pois teria de voltar para sua cidade. Ficou sentida com a situação do antigo amigo, que nunca se casou pensando em desposá-la um dia. Como não a vira mais e sabia que jamais a teria em seus braços, Fábio passou a beber diariamente, alimentando também o vício do cigarro. Anos a fio passou dias e noites em farras, companheiro apenas da bebida e do fumo, que terminaram comprometendo a sua saúde.
    Já em casa Paola ficou pensativa com a situação de Fábio. Poderia até ajudá-lo de algum forma, não se comprometendo em nada além disso, mas ficou só no pensamento, pois não retornara à cidade de origem, desde que seus pais faleceram. Sozinha naquela cidade e morando em lugar confortável, já havia decidido manter esse tipo de vida.
    A solidão nem sempre é ruim para as pessoas, mesmo quando percebe que a idade vai avançando. Para Paola, que faz caridade para um abrigo de idosos, onde é considerada como uma mãe e investe lá algum dinheiro, já se prepara para viver ali quando não tiver mais condições de se manter sozinha.

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