A chuva fina da manhã não impediu Cássio de sair de casa. Estava
transtornado, aquele mesmo sonho de quase todas as noites o atormentava,
deixava-o tenso, não conseguia nem se concentrar direito no trabalho. Queria
achar uma solução, uma explicação para esse sonho. Seguiu para aquele parque
que ficava a algumas quadras da sua casa, queria ver se lá estava a figura de
um homem que vestia uma capa preta e que povoava os seus sonhos. Rondou por ali
mesmo debaixo da chuva fina que não parava, procurou por todos os cantos do
imenso parque, mas só via pessoas comuns, criaturas semelhantes a ele, algumas
sorridentes, outras bem sérias e talvez carregando algum tipo de problema.
Já era quase meio dia, a chuva havia cessado e o sol brilhava. Crianças
brincavam alegremente aos cuidados dos pais ou responsáveis, mas Cássio
permanecia ali como que esperando que o estranho homem da capa preta surgisse
ou desse algum sinal da sua presença. Nos sonhos ele chamava Cássio, queria a
sua presença ali no parque, o ameaçava sem ele saber a razão. Era um domingo e
a fome já anunciava que seu estômago precisava de comida e ele voltou para casa.
O dia passou rapidamente sem que Cássio percebesse, de tão transtornado
que estava, a noite enfim chegou e ele já se inquietou. Seria mais uma noite de
agonia, de desespero com aquele sonho. Passava muitas noites acordado, mesmo
sabendo que no dia seguinte teria que trabalhar, mas não conseguia pregar o
olho, tinha receio daquela figura ameaçadora, não sabia o que aquele estranho
queria. Enfim o cansaço o dominou e ele terminou dormindo mesmo sem jantar, o
dia seguinte seria de trabalho e não desejava impressionar os companheiros que
já estavam desconfiados de que enfrentava algum problema.
A noite de sono foi uma maravilha, acordou disposto, após o banho tomou
o café da manhã e saiu para o trabalho. Foi a primeira vez que ele se sentiu
tranquilo depois de muitos dias sem conseguir sorrir, sem cumprimentar as
pessoas com alegria. Na chegada ao escritório um sonoro “bom dia” deixou os
companheiros surpresos e até felizes, pois já estavam a ponto de chamá-lo para
uma conversa para tentarem ajudá-lo se estivesse com alguma dificuldade
pessoal. Trabalhou normalmente, almoçou na cantina ao lado do escritório e
iniciou o segundo expediente dando prosseguimento ao seu trabalho como
encarregado financeiro da firma. A tarde já findava e o relógio na parede
anunciava a hora de fechar o escritório quando uma figura bastante conhecida de
Cássio adentrou o mesmo. Ele ficou paralisado e soltou um grito que ecoou por
toda a firma, vindo em seguida a desfalecer. Acordou mais tarde no hospital com
o médico diagnosticando o seu caso: estava entrando numa fase de início de
loucura e teria que se afastar do trabalho. Perguntou sobre o homem que entrara
no escritório e que vestia uma capa preta e todos que ali estavam responderam
que não viram ninguém e que ele apenas se descontrolou repentinamente.
Afastado do trabalho e aos cuidados da família, Cássio está sendo
tratado com medicamentos antidepressivos devido ao excesso de trabalho.