quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

CONFISSÕES DE UM EX-MORTO


Na sala de cirurgia eu observava todos aqueles equipamentos, indagava a mim mesmo a função de cada um, o que na realidade não me interessava, era apenas uma forma de me distrair, de tapear a minha mente que estava um pouco receosa diante de um ato cirúrgico que em alguns minutos seria iniciado. Me foi concedido um tempo para uma breve reflexão e enquanto médico e colaboradores se preparavam para essa finalidade eu ali imaginei como seria o meu mundo de "amanhã"  baseado em tudo o que vivi no "ontem", já que no momento atual eu me sentia como se não existisse, me senti como uma "experiência" a ser apreciada por aqueles que ali se encontravam e eu era o "produto" que poderia ou não dar certo, uma evidência bem clara que em certo momento me fez verter algumas lágrimas.
Afinal tudo iria começar e os procedimentos tiveram início, momento em que apaguei completamente depois da anestesia. Foi como se eu mergulhasse no desconhecido sem nada compreender e em pouco tempo "despertei", não para este mundo, como pensei por alguns instantes, mas para uma "realidade" que me fez estranhar, pois eu via e ouvia aqueles que me operavam, apesar de não captar com precisão o que eles conversavam. Era tudo esquisito, em certas ocasiões riam e faziam gestos, o que me deixava chateado, mas como nada podia fazer o jeito era aceitar e aguardar o desfecho da cirurgia de sério risco por se tratar do órgão mais importante do corpo que era o coração.
Horas se passaram e a impaciência tomava conta de mim, ali imóvel sem poder mover um dedo sequer, mas de repente a minha visão apagou-se por completo e só o cérebro funcionava, graças a Deus eu me sentia vivo, pelo menos isso. Mas foram momentos de incerteza, sem nada ver ou ouvir, o que me fez pensar que estava morto, para o mundo, claro, não para mim, apesar dessa situação um tanto estranha, mas isso durou pouco tempo, pois enfim despertei para a vida, vi o quarto do hospital claro e arejado, diferente daquele no qual eu me encontrava para a cirurgia. Êpa! Que lugar é esse? Me levantei num único movimento e percebi que ali não se encontravam as pessoas que cuidavam de mim. Como ali se via com clareza algumas enfermeiras (acho que eram), todas de roupas brancas, indaguei o que estava acontecendo, o que elas não responderam e apenas me pediu para ter calma que depois conversariam a respeito. Nada pude fazer e depois que me aplicaram uma injeção eu voltei a dormir, um sono reparador, diga-se de passagem. Acordei depois de um certo tempo que não consegui saber, o dia estava claro e cama me levantei, já que não via ninguém ali por perto. Caminhei até a porta e vislumbrei um jardim florido, pássaros que entoavam cantos maviosos e algumas pessoas que circulavam ali próximo. Tive vontade de ir até elas, mas qundo tentei fui impedido por dois robustos senhores  vestiam branco, deduzindo eu que se tratava de médicos. Fui colocado de volta na cama e novamente dopado com outra injeção e antes de apagar ouvi quando um deles afirmou: "esse vai voltar".
Novamente aquela sensação de que estava morto, a escuridão total e a impossibilidade de fazer qualquer movimento. Pelo tempo que passei naquela situação calculei umas duas horas mais ou menos, o que me deixou bastante angustiado, mas enfim tudo começava a ficar claro e o lugar onde agora eu me encontrava era  mesmo de quando me internei para a cirurgia no coração. Via perfeitamente o médico e seus assistentes, todos sorridentes. Fui colocado numa maca e levado para um quarto onde fui acomodado num leito bem confortável e ainda grogue escutei quando o médico falou: "esse escapou por milagre".

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