domingo, 22 de dezembro de 2013

O HOMEM DA CAPA PRETA

   A chuva fina da manhã não impediu Cássio de sair de casa. Estava transtornado, aquele mesmo sonho de quase todas as noites o atormentava, deixava-o tenso, não conseguia nem se concentrar direito no trabalho. Queria achar uma solução, uma explicação para esse sonho. Seguiu para aquele parque que ficava a algumas quadras da sua casa, queria ver se lá estava a figura de um homem que vestia uma capa preta e que povoava os seus sonhos. Rondou por ali mesmo debaixo da chuva fina que não parava, procurou por todos os cantos do imenso parque, mas só via pessoas comuns, criaturas semelhantes a ele, algumas sorridentes, outras bem sérias e talvez carregando algum tipo de problema.
   Já era quase meio dia, a chuva havia cessado e o sol brilhava. Crianças brincavam alegremente aos cuidados dos pais ou responsáveis, mas Cássio permanecia ali como que esperando que o estranho homem da capa preta surgisse ou desse algum sinal da sua presença. Nos sonhos ele chamava Cássio, queria a sua presença ali no parque, o ameaçava sem ele saber a razão. Era um domingo e a fome já anunciava que seu estômago precisava de comida e ele voltou para casa.
   O dia passou rapidamente sem que Cássio percebesse, de tão transtornado que estava, a noite enfim chegou e ele já se inquietou. Seria mais uma noite de agonia, de desespero com aquele sonho. Passava muitas noites acordado, mesmo sabendo que no dia seguinte teria que trabalhar, mas não conseguia pregar o olho, tinha receio daquela figura ameaçadora, não sabia o que aquele estranho queria. Enfim o cansaço o dominou e ele terminou dormindo mesmo sem jantar, o dia seguinte seria de trabalho e não desejava impressionar os companheiros que já estavam desconfiados de que enfrentava algum problema.
   A noite de sono foi uma maravilha, acordou disposto, após o banho tomou o café da manhã e saiu para o trabalho. Foi a primeira vez que ele se sentiu tranquilo depois de muitos dias sem conseguir sorrir, sem cumprimentar as pessoas com alegria. Na chegada ao escritório um sonoro “bom dia” deixou os companheiros surpresos e até felizes, pois já estavam a ponto de chamá-lo para uma conversa para tentarem ajudá-lo se estivesse com alguma dificuldade pessoal. Trabalhou normalmente, almoçou na cantina ao lado do escritório e iniciou o segundo expediente dando prosseguimento ao seu trabalho como encarregado financeiro da firma. A tarde já findava e o relógio na parede anunciava a hora de fechar o escritório quando uma figura bastante conhecida de Cássio adentrou o mesmo. Ele ficou paralisado e soltou um grito que ecoou por toda a firma, vindo em seguida a desfalecer. Acordou mais tarde no hospital com o médico diagnosticando o seu caso: estava entrando numa fase de início de loucura e teria que se afastar do trabalho. Perguntou sobre o homem que entrara no escritório e que vestia uma capa preta e todos que ali estavam responderam que não viram ninguém e que ele apenas se descontrolou repentinamente.

   Afastado do trabalho e aos cuidados da família, Cássio está sendo tratado com medicamentos antidepressivos devido ao excesso de trabalho.

domingo, 15 de dezembro de 2013

CAVALEIROS DA LUZ

   Igor se deslumbrava com os raios do sol, se impressionava com a claridade que o astro rei despejava sobre a face da Terra. O que seria do nosso planeta sem essa claridade, sem essa oportunidade de vermos tudo sem ter que recorrer a luz artificial? Mas até a luz artificial impressionava Igor, que ficava horas a imaginar coisas que só o seu cérebro podia imaginar. A luz do sol durante o dia e a luz artificial durante a noite, isso o fazia imaginar um monte de coisas, que fugiam até da normalidade, do dia a dia do planeta Terra.

   Costumava ficar um bom tempo apreciando o nascer do sol, curtia a mudança do escuro para o claro. Imaginava poder controlar a luz, modificar os costumes das pessoas e transformar o mundo sem ter que prejudicá-las. Geralmente era no final da tarde que apreciava a luz do sol ir embora e o mundo entrar na escuridão, preferindo um local ermo para esse espetáculo da natureza. Tinha uma luz especial que se fazia presente em sua mente, que surgia no horizonte e percorria o céu do nascente ao poente, com mistura de cores, que o deixava extasiado. Só ele percebia essa luz, onde cavaleiros elegantemente vestidos, em cavalos que flutuavam majestosamente no espaço, como se estivessem cavalgando por estradas ou caminhos sólidos, parando vez ou outra e cumprimentando-o. Igor acenava para eles, sorria, aceitando as suas reverências. Era uma cena de pura beleza, de satisfação total para quem admirava a luz. Ao final da apresentação Igor aplaudia, vendo os cavaleiros sumirem na luz que aos poucos ia se dissipando e fazendo com que ele voltasse a realidade. Sonho? Imaginação? Igor não sabia explicar, apenas queria viver aquele momento de felicidade.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

INGRATIDÃO (de A a Z)

A minha vida se transformou completamente
B usquei opções mas foi em vão
C horei imensamente sem me controlar
D espi minha alma, ensaiei um cantarolar
E a música não saía como eu queria
F oi um fracasso, tudo por um motivo
G ostava de alguém e me decepcionei
H oje amargo a tristeza, a razão não sei
I gratidão, peso que carrego no coração
J uro que daria tudo para esquecer
L utaria para jogar fora a minha aflição
M esmo que custasse todo o meu sangue
N ão mediria esforços contra a ingratidão
O meu íntimo iria então agradecer
P ois isso é o que preciso conhecer
Q ualquer pouquinho de paz, qualquer alegria
R esolveria tudo, meu coração reagiria
S eria um pouco com tamanho de muito
T raria de volta a minha auto-estima
U m tantinho da felicidade que preciso
V oltar a sorrir, agradecer a Deus
X da questão, rumar por outro caminho
Z erar as incertezas, procurar carinho

DEBAIXO DO COBERTOR

... o vento sopra suavemente
... a noite é só silêncio
... e o frio parece congelar até os ossos
(D)eitado, eu fico apenas imaginando
(E)nquanto estou aquecido na cama
(B)em quentinha e confortável, alguém clama
(A)goniza, talvez, com o frio da rua
(I)mpaciente, nada posso fazer
(X)ingo o destino, procuro qualquer motivo
(O) suficiente para livrar alguém cativo
... do vento que sopra suavemente
... nessa noite que é de silêncio
... e do frio que congela os ossos
(D)ormir eu não consigo
(O) irmão sofre castigo
... do vento suave
... da noite silenciosa
... do frio congelante
(C)oberto me sinto protegido
(O) vento e o frio não me incomodam
(B)em de manhã uns não acordam
(E)is a questão que me faz meditar
(R)ezo por eles, não posso acreditar
(T)er que aguentar essa situação
(O) cobertor me protege, mas não o coração
(R)azão de toda essa lamúria em vão

CORPO DESPIDO VISTO PELA FRESTA

                 pela fresta da parede eu vi seu corpo
                 ela se preocupava com sua aparência
            diante do espelho demonstrava inocência
                        se achava a mais bela do mundo
                           nem por isso almejava riqueza
             a pobreza no barraco era sua companhia
               não tinha ninguém, assim mesmo sorria
                     estava sempre de bem com a vida
            na rua o vestido surrado tirava seu brilho
                  era simples, não gostava de se exibir
                   qualquer roupa servia para lhe vestir
           só dentro de casa detestava a vestimenta
                              e eu descobri isso por acaso
                 esse detalhe chamou a minha atenção
            olhando pela fresta palpitava meu coração
               aquele corpo me seduzia, me encantava
            já estava me acostumando a vê-lo despido
                          imaginava encostando-o ao meu
                 mas na realidade isso nunca aconteceu
                até que ela sumiu, não sei para onde foi